Prólogo

O ATOR E AS CIDADES

O homem está na cidade
como uma coisa está em outra
e a cidade está no homem
que está em outra cidade

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A arte do ator é feita de chegadas e partidas, a cada cidade uma nova experiência, em cada uma ele deixa um pouco de si e leva um pouco de tudo: rostos, risos, lágrimas, histórias, vivências, sensações. O trânsito, a mobilidade é a pátria do despatriado ator, vagar entre culturas, costumes e tempos diferentes é sua sina e paixão, pois ele se compõe e recompõe de cada momento. Tolo é aquele que pensa que a arte morre, tem seu lugar determinado por marcas geográficas, por cronologias... a arte foge de todo e qualquer enquadramento, não cabe no mapa, pois é cigana, não (re)conhece fronteiras, ela se constitui a partir do trânsito, do vagabundear do ator, seu veículo. Em sua carne e expressões ela ganha corpo e reflete os rostos de todos os homens de todos os tempos, arguta e criativa, ela mimetiza o mundo e esse seu habitante conturbado, o Homem e é adsorvida por ele.

A 24ª Semana Luiz Antônio traz a criativa itinerância que brota da releitura de grandes clássicos, de personagens que vagaram pelo mundo e foram incorporando os novos tempos, as novas cidades e estéticas. Em seus corações pulsam as lembranças da origem, mas em suas vestes o novo, o arrojado trânsito por locais insondáveis. E como diz o poeta:


a cidade está no homem
quase como a árvore voa
no pássaro que a deixa.

Ferreira Gullar



Evoé! e muita Lu(i)z...



Flávia Marquetti



sábado, 25 de junho de 2011

UM OLHAR MARCADO POR OUTROS OLHARES: AMOR QUE NÃO OUSA DIZER SEU NOME





A Cia Filhos de Alfredo trouxe ao palco do Teatro Municipal olhares antagônicos, mesclando os assassinatos cometidos pelo maníaco do Trianon e o julgamento de Oscar Wilde à omissão e vergonha dos familiares dos homossexuais assassinados juntamente com a condenação de Wilde, pela sociedade inglesa.

A inclusão de Oscar Wilde no cenário teatral atual é bastante oportuna, pois, só agora em pleno século XXI (2011), “O retrato de Dorian Gray”, romance datado de 1890, foi publicado sem cortes. E mais oportuna ainda foi a correlação estabelecida entre a violência cometida pelo maníaco do Trianon sobre suas vítimas com a violência que estes sofreram de seus próprios familiares, que envergonhados pela condição homossexual das mesmas, não se empenharam em lhes fazer justiça, muitas vezes barrando as investigações.

Alternando vídeos com “depoimentos” sobre os assassinatos, textos de cartas de Wilde a seu amante, cenas ligadas aos inquéritos policiais no Brasil e do julgamento em Londres, os dois atores da Cia revezaram-se em diversos papéis, com atuações seguras e bem construídas. O palco, com alguns objetos em cena, ora ligados a Wilde ora aos inquéritos policiais, ganha contornos e limites com uma iluminação precisa e bela, que alterna tons quentes (laranja e vermelho) a frios (azul), pontuando os espaços e os séculos que os separam: Londres (1895) e São Paulo (1980), mas aproximando-os no mesmo preconceito, incompreensão... na mesma cena.

Flávia Marquetti

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