Prólogo

O ATOR E AS CIDADES

O homem está na cidade
como uma coisa está em outra
e a cidade está no homem
que está em outra cidade

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A arte do ator é feita de chegadas e partidas, a cada cidade uma nova experiência, em cada uma ele deixa um pouco de si e leva um pouco de tudo: rostos, risos, lágrimas, histórias, vivências, sensações. O trânsito, a mobilidade é a pátria do despatriado ator, vagar entre culturas, costumes e tempos diferentes é sua sina e paixão, pois ele se compõe e recompõe de cada momento. Tolo é aquele que pensa que a arte morre, tem seu lugar determinado por marcas geográficas, por cronologias... a arte foge de todo e qualquer enquadramento, não cabe no mapa, pois é cigana, não (re)conhece fronteiras, ela se constitui a partir do trânsito, do vagabundear do ator, seu veículo. Em sua carne e expressões ela ganha corpo e reflete os rostos de todos os homens de todos os tempos, arguta e criativa, ela mimetiza o mundo e esse seu habitante conturbado, o Homem e é adsorvida por ele.

A 24ª Semana Luiz Antônio traz a criativa itinerância que brota da releitura de grandes clássicos, de personagens que vagaram pelo mundo e foram incorporando os novos tempos, as novas cidades e estéticas. Em seus corações pulsam as lembranças da origem, mas em suas vestes o novo, o arrojado trânsito por locais insondáveis. E como diz o poeta:


a cidade está no homem
quase como a árvore voa
no pássaro que a deixa.

Ferreira Gullar



Evoé! e muita Lu(i)z...



Flávia Marquetti



sábado, 16 de junho de 2012

PERSONAGENS NO MUSEU: O HUMANO ENTREVISTO NA HISTÓRIA

A História contada a partir do humano, da lembrança sensível que se esconde nos objetos do Museu Histórico de Araraquara, esta é a proposta Di Souza e Patrícia Diniz. Em um percurso entrecortado de silêncios, à luz difusa de velas, as duas atrizes dão vida à memória da cidade de forma delicada, terna e intimista. Percorrendo as salas do Museu, com poucos objetos cênicos, um figurino enxuto e apropriado, uma maquilagem impecável e interpretações muito bem dosadas, Di e Patrícia levam o público de volta no tempo, mas não ao mundo da História impessoal e sim ao que resgata a essência das vidas que fincaram suas raízes no sertão de Araraquara. Imperdível, sobretudo, para aqueles que têm laços estreitos com o nascimento da cidade e para os que gostam do humano por trás da cidade.
Flávia Marquetti




Fotos: Lívia Cabrera

Dos moinhos

Você tem razão, Lívia, há poucos grupos que persistem no fazer teatral ligado à rua, em parte por ser considerado, por muitos, menos “sério” ou “glamoroso” que o teatro de palco italiano e, por outro lado, porque exige das trupes o "controle" sobre o imprevisto. Na rua, não basta ter domínio sobre seu personagem, o ator tem que saber driblar as inúmeras variáveis, como intervenções inadequadas de passantes, piadas mal intencionadas, os bêbados e andarilhos que sempre aparecem, a entrada abrupta de terceiros em cena, o ruído do trânsito, buzinas, som alto de carros e uma infinidade de outras interrupções. E, sobretudo, saber conquistar o público, retirá-lo da sua rotina e fazê-lo parar para ver; é saber realizar o espetáculo para uma única pessoa ou uma multidão. E os guris do UEBA mostraram que são bons nisso, conseguiram até mesmo laçar a difícil e instável platéia araraquarense, como disse você. O que é de se lamentar em uma cidade que tem o histórico teatral que tem.

Flávia Marquetti

DO QUE PASSOU BOM QUIXOTE COM SEU ESCUDEIRO NA TERRA DO SOL


Andarilho, errante e sonhador, Dom Quixote é um dos personagens mais conhecidos e fascinantes da literatura mundial, ele, mais que qualquer outro, personifica a proposta desta 24ª Semana Luiz Antônio. E foi com a bravura e o espírito criativo de Quixote que o Grupo de Teatro UEBA – Produtos Notáveis, de Caxias do Sul, invadiu a Praça Pedro de Toledo para a abertura da SLAMC. Com uma versão atualizada do clássico, os atores da UEBA conseguiram trazer o bom cavaleiro e seu escudeiro ao século XXI sem perder a magia, o encantamento e a poesia do texto de Cervantes. Com atuações impecáveis, carismáticas e com muito humor, o grupo soube adaptar aos dias de hoje episódios emblemáticos, como por exemplo, a famosa cena da sagração de Quixote em cavaleiro, em Cervantes, essa se passa em uma estalagem de não muito boa reputação, quando o futuro cavaleiro andante toma duas prostitutas por Damas de alta corte. Em sua vinda para o século XXI, as damas são dois travestis; os famosos moinhos de vento tiveram a mais perfeita releitura... foram representados por um boneco inflável, desses de postos de gasolina, solução simples e magistral, de efeito impecável no jogo cênico.
Outras soluções criadas pelo grupo para trazer Quixote e seus companheiros de aventura para a rua também foram magistrais, como o uso de uma bicicleta e de um triciclo como montarias de Quixote e Sancho; o uso da internet e de vídeos integrados às cenas; ou ainda adereços e indumentárias que fazem jus ao mais delirante sonho do cavaleiro, como transformar a rede que envolve um garrafão de vinho em elmo, talas e colete de imobilização em armadura. Já Dulcinéia, a amada idealizada de Quixote, assumiu as mais diversas personificações: de Marilyn Monroe, com direito à famosa cena do respiro do metrô, à Lady Gaga, culminado em um “duelo musical” que levou o público às lágrimas, de tanto rir.
Um espetáculo delicioso, que trouxe no delírio de Quixote o amor ao teatro, a tresloucada errância de seus atores em sua luta contra os moinhos da ignorância.
“Foi grande a sua bravura,
teve todo o mundo em pouco,
e na final conjuntura...
....vejam que ventura,
com siso vivendo louco!”
(Cervantes)
Flávia Marquetti



Fotos: Lívia Cabrera

segunda-feira, 11 de junho de 2012

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