Prólogo

O ATOR E AS CIDADES

O homem está na cidade
como uma coisa está em outra
e a cidade está no homem
que está em outra cidade

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A arte do ator é feita de chegadas e partidas, a cada cidade uma nova experiência, em cada uma ele deixa um pouco de si e leva um pouco de tudo: rostos, risos, lágrimas, histórias, vivências, sensações. O trânsito, a mobilidade é a pátria do despatriado ator, vagar entre culturas, costumes e tempos diferentes é sua sina e paixão, pois ele se compõe e recompõe de cada momento. Tolo é aquele que pensa que a arte morre, tem seu lugar determinado por marcas geográficas, por cronologias... a arte foge de todo e qualquer enquadramento, não cabe no mapa, pois é cigana, não (re)conhece fronteiras, ela se constitui a partir do trânsito, do vagabundear do ator, seu veículo. Em sua carne e expressões ela ganha corpo e reflete os rostos de todos os homens de todos os tempos, arguta e criativa, ela mimetiza o mundo e esse seu habitante conturbado, o Homem e é adsorvida por ele.

A 24ª Semana Luiz Antônio traz a criativa itinerância que brota da releitura de grandes clássicos, de personagens que vagaram pelo mundo e foram incorporando os novos tempos, as novas cidades e estéticas. Em seus corações pulsam as lembranças da origem, mas em suas vestes o novo, o arrojado trânsito por locais insondáveis. E como diz o poeta:


a cidade está no homem
quase como a árvore voa
no pássaro que a deixa.

Ferreira Gullar



Evoé! e muita Lu(i)z...



Flávia Marquetti



sábado, 25 de junho de 2011

O AMOR QUE (NÃO) OUSA DIZER SEU NOME

                                                                                                Fotos:Lívia Cabrera
A natureza épica do espetáculo da “Cia Filhos do Dr. Alfredo”, narrativo por excelência, convida o público a participar de uma quase conferência ilustrada sobre o tema encenado: a violência contra aqueles que têm uma orientação sexual diferente daquela que é considerada “normal”. A ponte entre o destino de encarcerado - que o conservadorismo britânico do final do século XIX reservou ao autor de “O retrato de Dorian Gray” - e excertos do conteúdo de depoimentos de parentes e pessoas ligadas às vítimas do Maníaco do Trianon, resultou em uma dramaturgia competente colocada em cena por uma direção eficiente como compete a um espetáculo que se propõe militante (e pedagógico, de certa forma) porque ousa dizer o nome do seu amor.

Mais uma vez (como em outros espetáculos que vimos nesta semana), o recurso utilizado foi levar a platéia para perto dos atores, no palco. O clima de intimidade se fez. Figurinos e adereços de cena (lixeiras, cadeiras, mesa, papéis, baú, televisão, tela) cumpriram junto com a atuação dos dois atores Alexandre Cruz e Marcelo Braga e do elenco em vídeo, uma tarefa não apenas estética, mas de informação e confirmação do que estava sendo demonstrado.

A estratégia de articular cenas dramáticas, textos narrativos e ilustrações de cenas de vídeo, criou um panorama favorável ao desenvolvimento do tema abordado. A troca em cena de elementos do figurino, o uso de cartazes, de fotografias, de um filme, completaram na medida o necessário para a realização de uma encenação engajada. Do meu ponto de vista, o traço que não chega a ser comprometedor, mas merecedor de uma revisão ficou por conta da necessidade aproximar a atuação de Marcelo Braga de um tom e de uma postura mais narrativa, épica. Quando o ator não se encontra investido dos seus papéis dramáticos, ele insiste em seguir representando, postura que seguidas vezes compromete o que o ator, não o personagem, está dizendo. E isso me parece importante porque o espetáculo tem muito a dizer!

Eduardo Montagnari

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