Prólogo

O ATOR E AS CIDADES

O homem está na cidade
como uma coisa está em outra
e a cidade está no homem
que está em outra cidade

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A arte do ator é feita de chegadas e partidas, a cada cidade uma nova experiência, em cada uma ele deixa um pouco de si e leva um pouco de tudo: rostos, risos, lágrimas, histórias, vivências, sensações. O trânsito, a mobilidade é a pátria do despatriado ator, vagar entre culturas, costumes e tempos diferentes é sua sina e paixão, pois ele se compõe e recompõe de cada momento. Tolo é aquele que pensa que a arte morre, tem seu lugar determinado por marcas geográficas, por cronologias... a arte foge de todo e qualquer enquadramento, não cabe no mapa, pois é cigana, não (re)conhece fronteiras, ela se constitui a partir do trânsito, do vagabundear do ator, seu veículo. Em sua carne e expressões ela ganha corpo e reflete os rostos de todos os homens de todos os tempos, arguta e criativa, ela mimetiza o mundo e esse seu habitante conturbado, o Homem e é adsorvida por ele.

A 24ª Semana Luiz Antônio traz a criativa itinerância que brota da releitura de grandes clássicos, de personagens que vagaram pelo mundo e foram incorporando os novos tempos, as novas cidades e estéticas. Em seus corações pulsam as lembranças da origem, mas em suas vestes o novo, o arrojado trânsito por locais insondáveis. E como diz o poeta:


a cidade está no homem
quase como a árvore voa
no pássaro que a deixa.

Ferreira Gullar



Evoé! e muita Lu(i)z...



Flávia Marquetti



quarta-feira, 23 de junho de 2010

Roleta Russa - (Cia Aindasemnome - Ribeirão Preto / SP)

Foto: Fabricio Guerreiro/Assesoria

A Cia Ainda Sem Nome, de Ribeirão Preto, buscou em Roleta Russa um jogo limite, no qual as personagens, no auge da sua violência e frustração, matam o que poderíamos chamar de poder, seja ele um representante da família, do clero, um chefe de serviço, ou outra forma qualquer. O tema que poderia ter sido melhor explorado rendeu uma peça morna, com lições de moral em algumas partes. Em um cenário todo quadriculado em branco e preto e com figurinos também nestas cores, que criam uma bela imagem, Roleta Russa deixou de explorar a idéia primeira que seu visual sugere: o Jogo de Xadrez, lembrando que este é um jogo de guerra. Sem usar de uma marcação característica do jogo, que poderia render muito, não só plasticamente, mas também à proposta, a Cia preferiu uma marcação e gestualidade a meio termo, corpos rijos, mas que não chegam a ser as peças do tabuleiro, que poderiam ser movidas por mãos invisíveis.
A música é o sexto integrante do grupo, longa, com letra que se funde à temática da peça, mas que não cria o efeito esperado, de comentar a cena nos moldes de Brecht, ação que esperei dela. O título também me pareceu perdido, pois o “jogo” de roleta russa é na verdade um misto de suicídio e assassinato, já que os que disputam voltam a arma para si e caso não ocorra o disparo é passada ao próximo e assim sucessivamente, até que um dos “jogadores” morra diante dos demais, esta idéia está ausente da peça, pois todos se voltam contra um personagem específico, com os demais alternando a possibilidade do assassinato, talvez os autores tenham pensado que esta troca da arma entre os personagens sugerisse a roleta russa, o que, no meu caso não ocorreu, fiquei torcendo para que o jogo de acusação iniciado realmente se voltasse aos demais personagens, mas também não correu. Faltou bala na agulha para Cia Ainda Sem Nome.

Flávia Regina Marquetti

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