Prólogo

O ATOR E AS CIDADES

O homem está na cidade
como uma coisa está em outra
e a cidade está no homem
que está em outra cidade

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A arte do ator é feita de chegadas e partidas, a cada cidade uma nova experiência, em cada uma ele deixa um pouco de si e leva um pouco de tudo: rostos, risos, lágrimas, histórias, vivências, sensações. O trânsito, a mobilidade é a pátria do despatriado ator, vagar entre culturas, costumes e tempos diferentes é sua sina e paixão, pois ele se compõe e recompõe de cada momento. Tolo é aquele que pensa que a arte morre, tem seu lugar determinado por marcas geográficas, por cronologias... a arte foge de todo e qualquer enquadramento, não cabe no mapa, pois é cigana, não (re)conhece fronteiras, ela se constitui a partir do trânsito, do vagabundear do ator, seu veículo. Em sua carne e expressões ela ganha corpo e reflete os rostos de todos os homens de todos os tempos, arguta e criativa, ela mimetiza o mundo e esse seu habitante conturbado, o Homem e é adsorvida por ele.

A 24ª Semana Luiz Antônio traz a criativa itinerância que brota da releitura de grandes clássicos, de personagens que vagaram pelo mundo e foram incorporando os novos tempos, as novas cidades e estéticas. Em seus corações pulsam as lembranças da origem, mas em suas vestes o novo, o arrojado trânsito por locais insondáveis. E como diz o poeta:


a cidade está no homem
quase como a árvore voa
no pássaro que a deixa.

Ferreira Gullar



Evoé! e muita Lu(i)z...



Flávia Marquetti



segunda-feira, 21 de junho de 2010

Escuro (Cia Hiato e Cia Simples de Teatro – SP)

A peça de hoje, Escuro, da Cia Hiato e Cia Simples de Teatro de São Paulo, foi uma deliciosa surpresa, digo isso porque fazer uma peça onde os personagens apresentam deficiências físicas e mesmo mentais nos leva a imaginar algo denso, pesado e as duas Cias nos pegam exatamente aí, com uma peça leve, divertida, com interpretações impecáveis, com figurinos, cenário e iluminação ao mesmo tempo simples e requintados, poderíamos dizer líricos.
Usando uma palheta que vai do azul ao verde, mais o branco e o negro, o figurino não só estabelece o elo necessário entre os seres e a água da piscina imaginária, como nos remete à idéia de tristeza, solidão e esperança, na vida desses delicados peixes mergulhados na piscina branca. O uso do branco para a piscina corrobora ainda mais para a idéia de amplidão e, portanto, de desamparo desses seres quase imaterias que flutuam no vazio de uma existência difícil.
O uso dos aquários enquanto um signo da piscina é magistral, pois não só dá a dimensão da água, mas também do confinamento e de serem os personagens “animais” em exposição, peixes exóticos devido às suas deficiências.
Para os que não puderam assistir a Escuro, lendo o que escrevo talvez tenham uma idéia errônea sobre a peça, embora quase todos os personagens apresentem algum tipo de problema visual, de fala ou auditivo, a peça transcende este limite e com uma dramaturgia deliciosa nos faz entrar na ciranda dos fatos e ver que todos nós fazemos parte desse universo, que as deficiências ali apresentadas são só uma divertida maneira de nos fazer ver a grande deficiência do ser humano: a incapacidade de comunicar seus sentimentos e de lidar com o diferente.

Flávia Regina Marquetti

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Todas as cenas sobrepostas, no todo ou recortadas seriam boas fotografias (quem sabe até registradas pelo personagem do fotógrafo). Craig não diz que a cena deve ser composta com tanto cuidado quanto um quadro? Nesse caso foram quanto uma fotografia. E pro final que parecia difícil ser interessante com tanta coisa acontecendo, foi fechado (com o início) arrancando interjeições de surpresa da plateia (pelo menos dos que estavam perto de mim).

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