Prólogo

O ATOR E AS CIDADES

O homem está na cidade
como uma coisa está em outra
e a cidade está no homem
que está em outra cidade

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A arte do ator é feita de chegadas e partidas, a cada cidade uma nova experiência, em cada uma ele deixa um pouco de si e leva um pouco de tudo: rostos, risos, lágrimas, histórias, vivências, sensações. O trânsito, a mobilidade é a pátria do despatriado ator, vagar entre culturas, costumes e tempos diferentes é sua sina e paixão, pois ele se compõe e recompõe de cada momento. Tolo é aquele que pensa que a arte morre, tem seu lugar determinado por marcas geográficas, por cronologias... a arte foge de todo e qualquer enquadramento, não cabe no mapa, pois é cigana, não (re)conhece fronteiras, ela se constitui a partir do trânsito, do vagabundear do ator, seu veículo. Em sua carne e expressões ela ganha corpo e reflete os rostos de todos os homens de todos os tempos, arguta e criativa, ela mimetiza o mundo e esse seu habitante conturbado, o Homem e é adsorvida por ele.

A 24ª Semana Luiz Antônio traz a criativa itinerância que brota da releitura de grandes clássicos, de personagens que vagaram pelo mundo e foram incorporando os novos tempos, as novas cidades e estéticas. Em seus corações pulsam as lembranças da origem, mas em suas vestes o novo, o arrojado trânsito por locais insondáveis. E como diz o poeta:


a cidade está no homem
quase como a árvore voa
no pássaro que a deixa.

Ferreira Gullar



Evoé! e muita Lu(i)z...



Flávia Marquetti



terça-feira, 22 de junho de 2010

4º CRUZAMENTO – AGORA NA ESQUINA DE ESCURO

Foto: Fabricio Guerreiro/Assesoria
Respondendo a Nany, muito bem colocada a sua observação Márcia, a atriz que fez a personagem Flávia teve um esmero incrível na construção da personagem, gestos, voz, impecável, o que nos mostra um trabalho árduo de observação e ensaios. Outro trabalho minucioso e divertido e que cativou a todos foi a da personagem Aline, ou ainda do menino, que como a Secretária era mais “natural”, mas primorosos, criando um equilíbrio entre as diversas dificuldades de expressão.
Por falar na gestualidade, o grupo todo apresentou uma sincronia na repetição de alguns gestos e mesmo no que chamei de ciranda das cenas maravilhosa. Como tudo no espetáculo de um cuidado minucioso, primoroso, uma jóia. Eu costumo fazer destaques de coisas que me chamam a atenção nas peças, nesta não consegui, o conjunto todo de Escuro é o destaque.
Quanto ao que você postou Zé Guilherme, muito boa leitura, toda as cenas da peça são arranjadas de forma a que as vejamos de vários ângulos, mas têm algo de imobilidade, de instantâneo, como fotos, que muito bem podem ter sido feitas pelo personagem do fotógrafo, mesmo porque havia uma ou várias fotos que estavam em cena, na mão das demais personagens, que nós não vimos e que bem podem ser as cenas mostradas.
Sua leitura das fotos também me levou a outra reflexão. Eu havia visto no título, Escuro, a idéia de imobilidade, de medo, fragilidade e até desespero que nos acomete quando ficamos em um local sem qualquer iluminação, mas com a sua sugestão me veio também a da câmara escura, usada para revelar as fotografias feitas com máquinas como a que portava o fotógrafo e por oposição o que não é visto nos é revelado na peça.
A idéia da circularidade do texto, que vai como numa espiral “apertando” as informações para chegar à mesma cena do início é excelente, sobretudo, porque deixou o final em aberto, havia vários personagens que poderiam ter sofrido o “acidente” na piscina, com exceção da Secretária que está ao microfone. A teia dramatúrgica criada por Leonardo Moreira é mágica, pois consegue não ser cansativa e nos prende sem que sintamos o tempo, por incrível que pareça, ela durou 1h30. Um trabalho de joalheria, é a palavra que melhor define Escuro, sinto muito pelos que não viram.

Flávia Regina Marquetti

2 comentários:

  1. Achei a peça lindíssima! Até agora estou pensando sobre o espetáculo delicado, divertido e que me emocionou muito. Acho que o tema da peça nào é a deficiência, mas a diferença entre nossa alma e nossa língua.
    Fiquei pensando na secretária e sua submissão, na fanha e sua vontade de cantar, no menino que perde os óculos, na linda loira que cuida da irmà deficiente, na cega que fala no microfone do clube, nas duas mulheres infelizes. Tudo é tão bem construído, tão bem acabado. Os atores estão ótimos, maravilhosos! Até achei que a atriz que faz a Flávia fosse cega mesmo. Ela é? Achei a dramaturgia ótima também, com as cenas repetidas até formarem a fotografia do começo.
    Genial! É bom ver peças assim. Ainda estou pensando.

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  2. caraca .... simplesmente impecável ... espetaculo maravilhoso ...

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