Prólogo

O ATOR E AS CIDADES

O homem está na cidade
como uma coisa está em outra
e a cidade está no homem
que está em outra cidade

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A arte do ator é feita de chegadas e partidas, a cada cidade uma nova experiência, em cada uma ele deixa um pouco de si e leva um pouco de tudo: rostos, risos, lágrimas, histórias, vivências, sensações. O trânsito, a mobilidade é a pátria do despatriado ator, vagar entre culturas, costumes e tempos diferentes é sua sina e paixão, pois ele se compõe e recompõe de cada momento. Tolo é aquele que pensa que a arte morre, tem seu lugar determinado por marcas geográficas, por cronologias... a arte foge de todo e qualquer enquadramento, não cabe no mapa, pois é cigana, não (re)conhece fronteiras, ela se constitui a partir do trânsito, do vagabundear do ator, seu veículo. Em sua carne e expressões ela ganha corpo e reflete os rostos de todos os homens de todos os tempos, arguta e criativa, ela mimetiza o mundo e esse seu habitante conturbado, o Homem e é adsorvida por ele.

A 24ª Semana Luiz Antônio traz a criativa itinerância que brota da releitura de grandes clássicos, de personagens que vagaram pelo mundo e foram incorporando os novos tempos, as novas cidades e estéticas. Em seus corações pulsam as lembranças da origem, mas em suas vestes o novo, o arrojado trânsito por locais insondáveis. E como diz o poeta:


a cidade está no homem
quase como a árvore voa
no pássaro que a deixa.

Ferreira Gullar



Evoé! e muita Lu(i)z...



Flávia Marquetti



sexta-feira, 25 de junho de 2010

IN ON IT (Fernando Eiras e Emílio de Mello – RJ)




De todas as peças teatrais até aqui vistas, a mais difícil de comentar talvez seja esta, de Fernando Eiras e Emílio Mello, IN ON IT. Dizer que é uma riqueza... é pouco e nada diz em verdade, que as atuações são primorosas e impecáveis, todo mundo já disse e os prêmios comprovam. Talvez convenha começar por dizer que esta peça é um dos mais tocantes duelos entre dois grandes atores que já se viu.
Segundo Nietzsche, todos os homens são uma ilha, isolados em seus mundos e incomunicáveis, este é o ponto de partida de IN ON IT, mas em sua estrutura muito bem desenhada, como a luz e a marcação cênica, encontramos intersecções (pontes) entre esses círculos/ilhas que compõem os encontros e desencontros das personagens.
Com um cenário limpo, só recortado pela luz, dez personagens constroem uma teia delicada de relações. Em nenhum momento a cena é óbvia, embora possa parecer de uma simplicidade quase pueril, mas é necessário que o espectador triplique a atenção para poder fruir esse jogo que é desenhado na luz, que abre e fecha focos circulares, cria quadrados que vão do branco ao vermelho, todos plenos de significados para a cena. A marcação dos atores obedece à mesma orquestração, a palavra contracenar ganha novo sentido nos corpos e gestos desses dois esgrimistas, ora quebrando com as convenções do que estamos acostumados a ver, ora dentro de um naturalismo tradicional.
É quase impossível detalhar os pormenores, ou isolar uma cena, pois cada segundo, cada gesto tem um contorno próprio, mesmo que os vejamos repetidos mais adiante, são outros, embora os mesmos e é esse o segredo de IN ON IT, ser muitas peças em uma só, ser o conflito de vários personagens em um. Múltiplo e uno; perfeito no todo, mas deliciosamente fragmentário; quase uma divindade que nos toca e nos leva ao êxtase, só assistindo para sabê-lo.
Em tempo, nada mais perfeito para comemorar o dia do aniversário do Luiz Antônio do que a apresentação de Fernando Eiras e Emílio de Mello, o Luiz ia amar a peça e o trabalho dos atores. Evoé Fernando! Evoé Emílio! Evoé Luiz! Que a estrela de vocês continue brilhando muito.

Flávia Regina Marquetti

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