Prólogo

O ATOR E AS CIDADES

O homem está na cidade
como uma coisa está em outra
e a cidade está no homem
que está em outra cidade

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A arte do ator é feita de chegadas e partidas, a cada cidade uma nova experiência, em cada uma ele deixa um pouco de si e leva um pouco de tudo: rostos, risos, lágrimas, histórias, vivências, sensações. O trânsito, a mobilidade é a pátria do despatriado ator, vagar entre culturas, costumes e tempos diferentes é sua sina e paixão, pois ele se compõe e recompõe de cada momento. Tolo é aquele que pensa que a arte morre, tem seu lugar determinado por marcas geográficas, por cronologias... a arte foge de todo e qualquer enquadramento, não cabe no mapa, pois é cigana, não (re)conhece fronteiras, ela se constitui a partir do trânsito, do vagabundear do ator, seu veículo. Em sua carne e expressões ela ganha corpo e reflete os rostos de todos os homens de todos os tempos, arguta e criativa, ela mimetiza o mundo e esse seu habitante conturbado, o Homem e é adsorvida por ele.

A 24ª Semana Luiz Antônio traz a criativa itinerância que brota da releitura de grandes clássicos, de personagens que vagaram pelo mundo e foram incorporando os novos tempos, as novas cidades e estéticas. Em seus corações pulsam as lembranças da origem, mas em suas vestes o novo, o arrojado trânsito por locais insondáveis. E como diz o poeta:


a cidade está no homem
quase como a árvore voa
no pássaro que a deixa.

Ferreira Gullar



Evoé! e muita Lu(i)z...



Flávia Marquetti



quarta-feira, 20 de junho de 2012

SOBRE_VOO

Compartilhar a ausência, o vazio e todas as sensações que inquietam o homem nos limites de sua existência solitária é o que move a peça Sobre_Voo. Se a tomarmos ainda em solo firme, objetivamente, ela parece falar das experiências de um aviador, Antoine de Saint-Exupery, piloto e escritor do qual Weber Fonseca tomou e adaptou algumas obras, em especial Terra dos Homens, que serve de base para a peça. Mas à medida que seu personagem ganha a amplidão dos céus em um avião da década de 30, frágil, exposto às intempéries e lutando para superar o insuperável, as distâncias intransponíveis, observamos que o texto fala de um ser humano não datado, de uma busca pungente e incessante de algo mais, uma ânsia que escapa à razão, ultrapassa todas as fronteiras, pois se encontra no único lugar realmente desconhecido, o próprio homem. A viagem, sustentada pelas asas de um texto lindamente entrecortado de fatos, lembranças e pensamentos, sobe aos céus, explora o silêncio, as grandes áreas desertas e isoladas, virgens do toque humano para mergulhar na essência do homem e tentar descobrir o que o faz transcender sua condição animal. O cenário despojado, composto apenas por uma bicicleta, um baú e alguns objetos indispensáveis, somado ao amplo palco do Teatro Municipal contribuiu muito para que o efeito de vazio, isolamento e vastidão fosse reforçado. A iluminação, de Ricardo Portari, confere contornos mágicos às cenas, como ao projetar a sombra do ator em sua bicicleta/avião na parede lateral do teatro, sem chão, flutuando sobre a platéia, desconstruindo a realidade e realizando o impossível, fazer voar o personagem. Ou ainda no jogo delicado das luzes colocadas no chão, como que delimitando uma pista de pouso e decolagem, que alternam suas cores e intensidades para fazer emergir entre a luz e as sombras da memória outros personagens, outros espaços, descortinando um mundo de sentimentos. Não menos impecável é a trilha sonora, mais que um acompanhamento das cenas, ela estabelece um diálogo com o texto, atua junto com o ator, as canções, todas em francês, completam esse belíssimo mapa traçado a partir de palavras, silêncios e alma. 

 Flávia Marquetti

 foto divulgação: Fábio Miceli

4 comentários:

  1. Um espetáculo de deixar o espectador de boca aberta, magnifico, uma interpretação de encher os olhos, uma plastica de deixar hipnotizado , particularmente amei, amo, kero ver de novo pela terceira vez, PARABÉNS WEBER . Larissa Mariano

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  2. Obrigado pelo texto! Alma resume de fato tudo o que sinto! Obrigado à Semana! Agora me despeço como espectador pois vou novamente sobre_voar Curitiba MOgi!
    Um grande beijo a todos, saúde, teatro e alegria para nossas vidas!

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  3. Esse espetáculo levam o público por várias viagens
    Do Ocidente ao Oriente
    Explorando o mundo e entre cartas !

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  4. Muito bom, impressionante a atuação... Fiquei impressionado que só depois de 25 anos pisou no palco... Parabéns! Concentração de dar inveja!

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