Prólogo

O ATOR E AS CIDADES

O homem está na cidade
como uma coisa está em outra
e a cidade está no homem
que está em outra cidade

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A arte do ator é feita de chegadas e partidas, a cada cidade uma nova experiência, em cada uma ele deixa um pouco de si e leva um pouco de tudo: rostos, risos, lágrimas, histórias, vivências, sensações. O trânsito, a mobilidade é a pátria do despatriado ator, vagar entre culturas, costumes e tempos diferentes é sua sina e paixão, pois ele se compõe e recompõe de cada momento. Tolo é aquele que pensa que a arte morre, tem seu lugar determinado por marcas geográficas, por cronologias... a arte foge de todo e qualquer enquadramento, não cabe no mapa, pois é cigana, não (re)conhece fronteiras, ela se constitui a partir do trânsito, do vagabundear do ator, seu veículo. Em sua carne e expressões ela ganha corpo e reflete os rostos de todos os homens de todos os tempos, arguta e criativa, ela mimetiza o mundo e esse seu habitante conturbado, o Homem e é adsorvida por ele.

A 24ª Semana Luiz Antônio traz a criativa itinerância que brota da releitura de grandes clássicos, de personagens que vagaram pelo mundo e foram incorporando os novos tempos, as novas cidades e estéticas. Em seus corações pulsam as lembranças da origem, mas em suas vestes o novo, o arrojado trânsito por locais insondáveis. E como diz o poeta:


a cidade está no homem
quase como a árvore voa
no pássaro que a deixa.

Ferreira Gullar



Evoé! e muita Lu(i)z...



Flávia Marquetti



sexta-feira, 22 de junho de 2012

AS ESTRELAS DO ORINOCO


Em uma noite chuvosa, quase diluvial, Bete Dorgan e Daniela Carmona navegaram pelo palco do teatro Municipal com reflexões sobre a vida mambembe do artista, a solidão em sua peregrinação em busca de trabalho, realização, reconhecimento e respeito enquanto ser humano. Alternando momentos engraçados aos ternos, o barco, comandado pelas duas atrizes, só no contexto da peça está à deriva, em cena, elas compõem seus personagens com esmero e sensibilidade. Sem cair no drama ou resvalar no óbvio, Bete e Daniela encontram o tom certo para as muitas oscilações de humor e sentimentos de Mina e Fifi. Afinadas, divertidas e, às vezes, ranzinzas as duas personagens preenchem o vazio de um barco a deriva no rio Orinoco. Abandonadas ali, sem saber para onde se dirigem, as duas criam uma bela metáfora da vida, suas derrotas, crises e, sobretudo, esperança.
O cenário e o figurino “brincam” com esse mundo que fica entre... entre dois períodos da vida, a juventude e a velhice, entre o real e o sonho, entre a certeza e a incerteza. Tudo é recriado a partir da palavra, é reinventado por Fifi, poderíamos dizer um Quixote feminino, que sonha e transforma a vida dura e real de Sancho, Mina, que, por sua vez, tenta proteger Fifi de seus delírios. Não é sem razão que as atrizes têm como indumentária básica “roupas íntimas”, suas personagens estão o tempo todo se despindo para nós, revelando seus sentimentos e dores, cabendo a Fifi/Quixote jogar sobre essa base as fantasias, os sonhos de um futuro, pois como diz o bordão da divertida música que ambas cantam... “ainda falta o mais interessante”. E foi assim, recriando a vida a partir das palavras que as duas atrizes nos levaram à terceira margem do Orinoco, onde sempre está por vir o mais interessante....
Flávia Marquetti

Foto: divulgação

Um comentário:

  1. O interessante sempre está por vir mesmo
    Viajando pelo mar que nunca acaba
    Mar Infinito e cheio de surpresas
    Amizade verdadeira

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